AS CERTEZAS INCERTAS DE UM TDAH






Assisti a uma entrevista da atriz Lília Cabral e uma frase sua chamou-me a atenção:  desde cedo, ainda adolescente, tinha absoluta certeza de que seria atriz.
Que inveja! Jamais tive certeza de nada a respeito da minha vida. E quando tive, estava absolutamente enganado.
Achei que seria um excelente advogado,  abandonei o curso; sonhei em ser filósofo, abandonei também; tive um sem número de amores infinitos e dezenas de empregos e empresas que julguei serem definitivos.
Que inveja, meu Deus!
Mas não invejo apenas aquelas pessoas que possuem certezas absolutas, invejo também àquelas que amam algo ou alguém de forma absoluta. Surpreendeu-me saber que algumas pessoas vieram de outros estados para dar o último adeus a Hebe Camargo. Quanto amor, meu Deus, e por uma pessoa que jamais soube da existência daquela tão devotada! Fico estupefato com essas pessoas; milhares, centenas de milhares de pessoas acompanharam a passagem do caixão de Ayrton Senna. Eu jamais sairia de casa para ver o caixão de qualquer celebridade; ou o casamento de uma princesa. Mais impressionado fico com aquelas pessoas que amam objetos e os colecionam, tornam-se experts em 'Gibis', armas antigas, trens de ferro, barbies, sei lá, uma infinidade de coisas que acabam se transformando em suas vidas.
Após mais de meio século de vida não encontrei nada que me arrebatasse de maneira absoluta.
Mas invejo as pessoas com essa capacidade de amor incondicional; à primeira vista pode parecer uma doença, uma obsessão, mas é capaz de oferecer um sentido a essas vidas, uma compensação de prazer ao dia a dia geralmente medíocre e massacrante que todos nós levamos.
O primeiro nome desse blog foi "A VIDA À DERIVA". Era assim que eu me sentia, e acho que todos nós, portadores de TDAH, nos sentimos assim em algum momento da vida. Ou em toda ela.
Tudo meu foi feito ao acaso, ao sabor do momento, num impulso de uma fração de segundo.
Decido as coisas de uma hora pra outra, sob o efeito de situações limite, em geral emocionais.
Jamais consegui traçar uma meta; se tracei, esqueci.
Admiro e invejo os metódicos, os organizados, os que possuem essa sagrada chama da certeza na vida. Sou o caos, sou do caos, sou fruto do caos. E isso cansa demais. Sonho com a estabilidade, sonho com a falta de surpresas, sonho com o cartesiano; mas acordo a cada dia de um jeito, precisando da ritalina para retomar o eixo, para refrear os impulsos irrefreáveis, para estabilizar o caos.
Hoje exerço uma profissão nova, que comecei aos 50 anos e que adoro, mas que me veio de uma forma imprevista e não programada. Sinceramente, entrei nela com uma sensação de provisoriedade, de que seria apenas momentâneo. Mas assim é minha vida, apaixonei-me ao ponto de sentir falta de meus aparelhos nos finais de semana, ainda hoje, domingão, pensei em dar um pulo na loja . Nunca imaginei isso em minha vida. Fruto da absoluta imprevisibilidade em que vivo.
Minhas atitudes imprevisíveis podem magoar, machucar aos outros e a mim; mas uma força maior do que eu  me impele a agir. Em alguns momentos sinto que está errado, mas faço, sigo em frente, não consigo parar.
Por isso me trato, tento estabilizar minha vida e por consequência a vida de quem me cerca. Ninguém pode viver à mercê da instabilidade alheia. Na verdade nem eu mesmo aguento mais tanta instabilidade e incerteza.
Parafraseando Sócrates, o filósofo: A única certeza que tenho, é que não tenho certeza nenhuma.
O que é uma pena...

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